A confusão que você causa,
bagunça que me procura, inesperado.
E eu te aceito de bom grado.
Me leva pra onde quiser,
só segura a minha mão,
e, quando eu tiver triste, me faz lembrar.
Me lembra dos romances de calçada,
do sexo, da madrugada,
da fome e do medo de te ter,
só pra te perder.
Eterno,
o que mora no mundo das possibilidades
e impossibilidades que criamos.
Assim perdura,
até onde quiser.
Escrevo entre o ali e o agora,
me segurando no inconsciente atemporal,
porque às vezes parece que foi ontem
e, às vezes, parece que o ontem já faz tempo demais.
E você não deve ser o mesmo,
tampouco eu sou,
mas acho que a gente combina além da roupa
que a gente não combinou,
já que a gente nunca combina nada…
mas como combinamos.
É como se o improviso soubesse mais da gente
do que a gente sabe de si.
Como se existisse uma coreografia secreta,
escondida no tropeço,
no toque que não foi dado,
mas que ficou no ar.
Tem dias que penso:
foi um breve amor ou só memória com afeto demais?
Tem dias que nem penso.
E aí você aparece sem aparecer,
nas entrelinhas de um filme velho,
num cheiro que atravessa o ventilador,
numa música que eu nem lembrava que existia.
E eu lembro.
Mesmo quando não quero.
Mesmo quando digo pra mim mesma:
“Já passou.”
(Como se o tempo entendesse de passar.)
Mas tem coisa que não passa.
Só aprende a ficar quieta.
E você,
você ficou assim em mim:
feito canto que não desafina,
mas que a gente aprende a cantar mais baixo
pra não acordar o resto da vida.
E, mesmo assim, às vezes, sem querer,
escapa um verso.
E eu penso:
se você ouvisse…
será que lembraria também?
Eu sei que sim.
Sob a luz fraca dos postes, suas mãos tremiam, a voz quase um sussurro. "Eu amo seus olhos" – como se eu já não soubesse. Seu sorriso veio hesitante, como quem espera a vida inteira Por algo breve, mas que, por um instante, parece certo.
"Eu sabia que não ia resistir", você riu, sem muita certeza, Uma verdade mal contada, perdida na fumaça do cigarro que prometeu largar. Disse que estava feliz – um disfarce bem ensaiado, Mas até os estranhos viam o contrário nos seus olhos.
Você achou que eu viraria as costas, que deixaria passar, Mas eu fiquei, deixei o momento durar. Um fogo que acendeu sem ninguém planejar, Um amor que tremia nas suas mãos.
"Eu torci para que você dissesse não", você brincou, meio sem graça, Como se isso fizesse tudo parecer menos errado. Mas seus dedos ficaram, sua voz prendeu, Como se quisesse mais do que admitia.
Um nome gravado numa pulseira esquecida, Uma promessa frágil demais para durar. Você provocou o fogo, mas sem coragem de queimar, Ainda assim, olhou, ainda assim voltou.
Achou que o tempo apagaria, que eu deixaria passar, Mas certos fantasmas não se deixam esquecer. Você sonhou com isso e agora finge que não, Mas nós dois sabemos como essa história termina.
A noite some, seu sorriso ainda ecoa, O calor da sua pele no ar frio da despedida. Talvez você repita que não significou nada, Mas nós dois sabemos – você sempre soube.
18. Criação do Feminino
Há muitas eternidades,
quando luz e matéria eram uma coisa só,
o Engenheiro Maior
saiu pelo infinito jardim do cosmos
embelezando a sua obra de perfeição.
Com seu pincel imaterial
salpicou o éter com galáxias e constelações,
colocou lindos anéis em Saturno;
com cores astrais
transformou Júpiter num gigante
sob todos os aspectos
e coloriu a Terra com o mais fascinante azul.
Depois, pegou a graça das andorinhas,
a delicadeza das borboletas,
o perfume das flores
e outros ingredientes misteriosos
criando, assim, a mulher,
obra prima de suas criações.
Tirou pequenas frações, pitadas mesmo,
da essência amorosa e emotiva da mulher,
juntou com energias primárias
vindas do seio da Terra
e criou o homem
para que esse também colaborasse,
junto com a mulher,
na obra de evolução e beleza
que é a vida!
Cláudio / 2006
17. Só para Mamães...
Um homem nunca poderá entender
a emoção de um corpo que se materializa
célula a célula, molécula a molécula
no aconchego do útero materno.
Como explicar em em palavras
a emoção de ouvir um inocente "mamãe"
seguido de um abraço carinhoso ?
Um homem nunca entenderá
de forma completa e integral
a ligação que se cria entre mãe e filho
que são a mesma carne, o mesmo sangue.
Que tipo de escala usaríamos
para medir o amor recíproco
entre esses dois seres?
Com que compararíamos esse afeto
de magnitudes inconcebíveis?
Maternidade: não só uma benção sagrada,
mas, também, uma missão...
O tamanho do amor que envolve
mães e filhos ainda é um mistério,
como o infinito... como o Criador Incriado...
e como tudo que ainda é inexplicável.
Cláudio - 2004
🌹🌹🌹
16. Consonâncias
Pólos que se atraem.
Promessas que se cumprem.
Sucessão de afinidades.
Harmonia nas diversidades.
Caminhos que convergem.
Pigmentos que combinam.
Órbitas que se cruzam.
Amizades emergentes.
Signos compatíveis.
Ascendentes presumíveis.
Sons que se casam.
Magnetismo entre seres.
Fragrâncias e cores.
Amizades e amores.
Tudo é regido
pela lei das afinidades,
desde a atração dos átomos
até a translação dos orbes.
Cláudio // 2002
🌷🌷🌷
15. Três Sílabas
Existe palavra mais bonita que "namorar" ?
O timbre é dos mais lindos
e a confecção gramatical é perfeita.
Um mar de promessas
e um universo de esperanças
estão ali nas entrelinhas...
Que palavra pode ser mais bonita?
Ela me lembra o doce calor de mãos delicadas,
o brilho confortador de um olhar,
o aconchego seguro de um abraço,
a ternura em gestos e atitudes
e o mergulho nas águas cálidas
da amizade incondicional.
São apenas três sílabas que,
montadas ou vistas sob outros ângulos,
geram outras palavras como: cafuné, sorvete,
pipoca, cinema... alegria !!!
Ainda assim eu ouso indagar:
existe palavra mais linda que "namorar"?
Sim é a resposta
pois a palavra mais bonita que "namorar"
é a palavra "sim"!
Cláudio / 2002
🌹
14. Dragão Indomável
É estranho estar na metrópole
onde cada metro quadrado vale uma fortuna.
As pessoas passam todas apressadas
e ninguém para e observa nenhum detalhe.
As coisas são monstruosas
e o odor que sai dos veículos é fétido,
mas, aparentemente, ninguém percebe.
Homens vociferam impropérios com naturalidade
e lindas mulheres passam diante de mendigos
como se eles não existissem;
como se elas tivessem tomado vacina
contra miséria.
Você é um imenso dragão, metrópole,
onde suas várias bocas
cospem labaredas para o ar
e seu coração bombeia para toda a cidade
um sangue nauseabundo
através de avenidas,
rios transformados em esgotos
e colossais serpentes petrificadas
transfiguradas em viadutos.
A solitária ambulância tocando a sirene,
presa no congestionamento da marginal
é atestado incontestável
do reflexo da indiferença
e do preço do progresso.
Novembro de 1996
🍂🍂🍂
13. Linda criança*
Você me comove,
linda criança de faces rosadas,
quando diz "vamo bincá?"
e me olha sorrindo,
aguardando minha resposta.
Nesses seus olhos castanhos,
noto um brilho que só a infância reflete,
vejo a рurеzа que defenderei
na medida do possivel
pois cedo ou tande todos pendemos a inocência.
Qualquer situação e local
são motivos de brincadeiras para você e,
por mais melancólico que eu esteja,
um sorriso rasga a dureza do meu rosto
diante de suas agruras e riso argentino,
que penetra no fundo da alma
e faz lembran tempos distantes.
Você me enternece
quando me faz perguntas simples
que deixam-me sem saber o que responder:
" - Onde mona o avião ?"
" - Porque o trem não anda na estrada ?"
" - O sapo faz xixi na cama ?"
" - Aqui é a casa do ônibus ?"
Depois de levantada uma questão,
jamais você abdica da mesma
e fica olhando-me de forma cândida e enigmática,
aguardando uma resposta.
Linda criança,
espero ser um bom pai e amigo,
se assim estiver escrito
no infindável livro do destino.
Agosto de 1996
🍂🍂🍂
*dedicada a Freed Davino
12. O dia começou
Sempre quando acordo
ainda está escuro lá fora
e o céu ainda se encontra
forrado de estrelas.
Todos os dias fico enfadado
por não ter tempo de apreciar
toda a beleza dos astros
pois o ônibus não tarda a vir.
A viagem é longa e cheia de solavancos
e quando acredita-se que não caiba mais ninguém
logo sobem mais dez passageiros.
Na rua passam estúpidos corajosos
que tem uma idéia muito mesquinha da vida
pois vivem passando no frente dos carros
como se as sinalizações servissem só para os outros.
Os acidentes são diários
pois homens trasformam meios de tranporte em "meios de correr" e,
nesse mar de problemas
chego quase salvo ao meu trabalho.
Todos querem descer do veículo
ao mesmo tempo e,
diante de hercúleo esforço,
consigo sair e percebo que o dia começou
quando o carro passa na poça de barro
e suja minha calça.
Chegando no serviço vou trabalhar em jejum
pois acabou o horario de café
e logo o chefe vem com dezenas de informações e reclamações,
as quais tento resolver de uma vez
e acabo não resolvendo nenhuma.
Uma coisa de cada vez... - penso
Após o expediente
repete-se aquele espetáculo hediondo:
Enorme massa de seres humanos
apinhada toda dentro dos ônibus.
Lembro que logo farei parte dessa massa
enquanto olho centenas de carros
que buzinam e se dirigem para todos os lados.
Chego em casa num estado deplorável
mas o banho é reconfortante
e a velha cama barulhenta é revitalizante.
Já embaixo de minhas cobertas surradas
Lembro-me de pessoas que nem isso tem
e peço a Deus que a todos proteja
enquanto a realidade vai dissipando-se
em milhares de cenas do dia
e logo vem a deliciosa sensação de queda
que indica que estou entrando
no universo onínico
onde encontrarei com amigos invisíveis
que me incentivarão a recomeçar amanhã
tudo de novo...
Junho de 1996
🚌🌛🌃☕🔕🚦
11. Fábrica
O trabalho é-me odioso agora
pois tudo que faço e construo não é meu
e quase todas amizades são cincunstanciais.
Isto deixa meu espírito enfastiado, esmorecido,
por ver pessoas tão valorosas
simplesmente largadas em serviços metódicos,
por ver atrofiar todo senso de cultura e criatividade
que são tão fortes na infância,
e por ver tanta falta de interesse pelo bem comum.
É uma corrida diária na direção de mais lucros
e tudo em volta é secundário,
e cada dia menos interessa
para que serve aquilo que nós produzimos;
se isso é bom ou mau, já não mais importa.
Imperceptivelmente vamos nos tornando insensíveis
em defesa dos próprios benefícios (mesquinhas quotas)
e acabamos nos esquecendo do motivo
que fez nossos corações começarem a pulsar
e nem tentamos mais redescobrir
o motivo de nossa existência.
A única coisa que nos diferencia de títeres
é o espírito que existe dentro de cada um de nós que,
as vezes, revolta-se e quer libertar-se mas que,
na maior parte das vezes
prefere vergar-se passivo e seguir a corrente.
Março de 1996
10. Fatamorgana*
As vezes fico pensando
em como seria ter outro corpo,
mas com minha total consciência.
Já pensei em ser o Jim Morrison,
com sua beleza comparável a divindades gregas
e sua perfeição de semideus no rosto e corpo
que preponderavam todos olhares humanos comuns.
Imaginei-me nesta abundância de beleza
a subjulgar centenas de corações
com um único gesto ou olhar
e tudo isso pareceu-me fascinante.
A alma linda e o corpo lindo;
isto seria uma utopia ou perdição?
Já imaginei-me voltando no tempo
e infiltrando-me no templo de Hatasu,
a única faraó de todas os dinastias,
e, num disfarce de soldado real,
seguir todas suas ordens com zelo e obediência.
O que ela iria dizer de um espelho,
ou talvez de um isqueiro ou de um refrigerante?
Talvez eu fosse tomado como um Deus
ou talvez fosse acusado de bruxaria...
É claro que não iria interferir na história
com todas essas futilidades modernas;
o que mais me interessaria era ver
todo o esplendor dos templos e povo egípcio
quando estavam em seu auge.
Minhas quimeras chegam ao ponto
de imaginar-me um cometa a deriva
viajando entre o tempo e espaço
sem preocupação com as frivolidades da vida
aprendendo os segredos do universo
em fascinantes descobertas cósmicas.
Nessa minha odisséia
conheceria novos planetas e novos seres e,
finalmente, chegaria até as bordas do universo
e descobriria onde nascem as almas.
Cláudio - Janeiro de 1996
🍂🍂🍂
*Todos os dicionários interpretam essa frase estável como miragens complexas, sobrepostas umas às outras e em constante mudança. Esta é uma palavra estrangeira que passou a fazer parte da nossa língua. O significado da palavra fata morgana como miragens complexas veio de marinheiros que viram fenômenos estranhos nos oceanos. Em italiano, fata morgana significa "miragem". É formado pelas palavras fata, que significa "fada" e morgana, e este já é um nome próprio. Em poesia a palavra pode ser interpretada como um tipo de delírio ou transe.
09. Profecia Consumada
Lembro de quando me procuraste na feira;
foi tão lindo!
Não conseguia parar de pensar em você,
foi quando, enquanto eu arrumava os mamões,
apareceste diante de mim.
Foi tanta alegria que os olhos umedeceram;
sentia vergonha de estar maltrapilho
mas sorriste
e senti-me um príncipe.
Havia uma certa inquietação
mas todas brumas dissiparam-se
quando você me deu um beijo rápido e estalado
pois percebi que realmente namorávamos.
Bem no âmago sabia que iria odiar-te
pois sentia paixão
e a paixão e o ódio estão muito próximos
porquanto a linha divisória dos mesmos
é tão fina que é quase imaginária.
Um dia lhe disse que pensei em você
todas horas do dia;
é insólito do que é capaz uma simples frase
porque, depois de tanto tempo
ainda lembro com perfeição sua resposta:
" - Não estou te amando cara
não se apegue a mim, tá ?"
Mais cedo do que se esperava
veio o arrependimento
por causa deste nefasto comentário,
mas aí já era tarde:
Profecia Consumada.
Dezembro de 1994
🥀
08. Meus Bons Amigos
Vivo no mundo da lua,
entre liteiras e carruagens,
princesas, Reis e guirlandas
(de rosas ou flores do campo)
e vou morrer de fome
e ser enterrado como indigente;
mas meus sentimentos,
materializados na forma destas linhas,
ficarão até que toquem as trombetas
dos arcanjos do céu
enquando houver um estouvado
que guande estas palavras emotivas
assim como guardei as palavras
de tantos outros julgados bufões.
Pessoas assim são muito sozinhas
mas não me embriago por isso;
as coisas expontâneas são mais importantes
e se você, que tanto amei,
foi embora sem se despedir,
paciência... pois arranco a solidão do peito,
com as próprias mãos da alma
e, em seu lugar, coloco meus poucos
e bons amigos
pois o importante não é a quantidade,
o importante é a intensidade.
Dezembro de 1994
🍂🍂🍂
07. Egoísmo
Meu mundo é muito simples,
sou obsoleto pois sonho com coisas
consideradas tolices hoje em dia.
Continuando a servir o bom Deus,
com minha solidariedade ao próximo
gostaria de ter uma esposa dedicada,
uma linda casa bem simples
com um belo terreno com árvores e grama,
uma fachada cheia de flores
e um filho, ou filha...
Ah! Uma filha... uma linda filha,
a quem eu escolheria o mais lindo dos nomes:
Neith¹ talvez, em referência a Deusa egípcia;
Náiade² porventura, homenageando amiga e mitologia.
É engraçado que sempre que penso nisso
desemboco num sentimento de usura
pois tantas antenas de TV cortam o horizonte,
há tanta fumaça, degradação
e espécies em extinção
que meu sonho parece ganância!
Penso nos seus lindos olhinhos brilhantes e castos
sendo degradados com toda indiferença
e intolerância do mundo moderno
que te julga pelo que você possui
e não pelo que você é,
que sorri em época de eleição,
que promete lotes de nuvem no céu
para aqueles que se fanatizem
e paguem o dízimo mensal.
Sempre meu devaneio parece egoísmo...
Ah , lindo sonho... espero estar enganado.
Dezembro de 1994
🍂🍂🍂
Obs.:
1. Neith - Uma das principais personagens do livro de Rochester (O Romance de uma Rainha). Segundo o autor, ela foi filha da primeira faraó mulher, chamada "Hatshepsut", que viveu 1400 anos antes de Cristo.
2. Náiade - homenagem a cara amiga Náiade Fukushima Trindade .
🍂🍂🍂
06. Hora vinte e cinco
Este é o poema mais apaixonado
que já escrevi em toda minha vida.
É para uma pessoa de rosto aveludado
e olhar jovial a quem entreguei,
deliciosamente, meu coração.
É para alguém de sorriso sábio e infantil
que me faz ter sentido essa vida.
Este é um poema para alguém
que amo tão intensamente
que poderia colocar o infinito num frasco
só para lhe dar de presente,
ou poderia andar milhares de léguas
em busca das mais lindas rosas
para lhe fazer uma guirlanda
e lhe coroar soberana do meu ser.
São linhas para alguém que transforma
o lixo de uns em matéria prima
dos seus sonhos e que,
talvez, eu nunca mais veja
mas que sempre estará aqui dentro de mim.
Estas são as palavras de um ser
de bem consigo mesmo
por ter tido a oportunidade
de experimentar o mais puro e cristalino amor,
coisa que poucos seres
tem o privilégio de viver .
São palavras de alguém que ama tanto
que nem sabe como explicar...
Olhando um botão de rosa
meus olhos umedecem pois
as flores e o perfume
são quase a sua presença;
tenho-lhe em meus pensamentos
a cada segundo do dia,
assim como habitas meus sonhos a noite
e se caso a vigésima quinta hora existisse,
também seria dedicada a você...
Outubro de 1994
🌹
05.Ninfa
Estou perdido no meio de um oceano
sem nome.
A Lembrança do seu olhar,
com brilho de ametista,
decapta minha sobriedade momentânea.
E que brilho tão lindo...
Um brilho místico, encharcado
de sonhos desmaterializados
e segredos que só um coração pensante
entenderia.
Deusa?
No mínimo uma mortal muito especial.
Um reflexo alegre e brincalhão,
em forma de fogo brando,
serpenteia em meu âmago
ao circunscrever seus traços, em pensamentos.
Sua voz longinqua e eficaz
mostra-me o caminho.
Momentos suntuosos e inesquecíveis
que hibernam em algum recanto
da nossa consciência, desabrochanão,
e nesse dia
nossas almas chorarão e se abraçarão
em decorrência da maior descoberta.
E o círculo estará completo...
Reis, Rainhas, Deuses e Bufões
estarão de mãos dadas,
comemorando a adormecida descoberta,
numa erupção de alegria
e estilhaçamento
de qualquer céptico ponto de vista.
Tudo será amor;
Amor...
Mas enquanto o dia não vem,
escondemo-nos atrás de feições;
continuemos dizendo e não sentindo,
sentindo e não dizendo
em um dia comum
e diferente de todos os outros.
Agosto de 1991
✨✨✨
Obs.: Escrevi esse poema quando eu tinha 19 anos, para a minha grande amiga Náiade Fukushima Trindade . Em determinado ponto do poema, mais ou menos na metade, ele traz a tona a inquietação de uma mente em ebulição com o tema da morte. Apesar da minha discrição e timidez, os pensamentos eram acelerados e precipitados, sempre tentando achar respostas para as grandes questões da vida que a maioria preferiria deixar prá trás. Nesse dia que escrevi isso, a minha ansiedade me levou a vislumbrar o outro lado da vida como uma continuidade e, intuitivamente, acessei esse mundo do além e entrevi a lógica da reencarnação (Reis, Rainhas, Deuses e Bufões). Escrevi sem compreender mas, não muito tempo depois, a grande amiga Débora Assis me emprestou um livro chamado "O Morro das Ilusões", da Zíbia Gaspareto. Esse livro foi um divisor de águas na minha vida; dali até Kardec foi um pulinho! Então comecei a entender o que eu mesmo escrevi e as visões que tive nesse dia, sobre as pessoas "atuarem" em papéis temporários aqui na Terra, quando "vestidos" de um corpo físico.
04. Incerteza
E como se eu estivesse
e não estivesse, ao mesmo tempo.
No mesmo instante posso estar
na minha dimensão particular
ou não, indo e vindo.
Num estranho mosaico de imagens sobrepostas
eu hesito
e indago minha existência.
Minha pureza é questionável pois,
algumas vezes,
prefiro não pensar em nada;
mas normalmente é estimável.
A incerteza é um enorme oceano
onde só vejo horizonte e,
para qualquer lado que direciono minha visão
não vejo nenhum sinal de ilha.
As nuvens deste céu são lindas
mas não sei voar.
Não é fácil esperar
alguém que você nem sabe se existe;
não é fácil gostar
de alguém que nem sabe que você existe.
Junho de 1991
⛵🌥️
03. Relógios
Inventaram o relógio
não com o objetivo
de criar uma nova forma de tortura
mas ele faz o tempo se arrastar,
quase sempre.
Este mesmo relógio
faz , as vezes,
vinte e quatro horas passarem
num piscar de olhos.
Um provérbio diz
que "o que é bom dura pouco"
o que leva a crer
que fazemos poucas coisas
que realmente gostamos.
Eu sempre quis ter o dia e a noite e,
a pesar de eu ter jogado
meu relógio fora,
vejo-os por toda parte
todos me perguntam
"-Que hores são ?"
Junho de 1990
⏳🕚⏰
01. Utopia
Custoso é explicar o que senti
quando observei o fulgor em seus olhos,
que expressam mais mistérios que o infinito:
Era como se ouvisse o silêncio,
criando as trevas com a luz
e o silêncio com os sons
num insano caleidoscópio
que fazia meu mundo ficar sem órbita.
Tentei abraçar os raios do Sol
imaginando seu corpo,
o sinuoso navegar das folhas de uma árvore
no ar em movimento,
lembram-me seus cabelos ao vento.
Qualquer brilho lembra seu olhar.
Fiquei pendido
pois antes achava
que a perfeição
era uma utopia.
Agosto de 1989
🌹