— Eu não conto, se você não contar.
ㅤEu te pediria desculpas por esse texto só pela sua cara de desapontado, mas não costumo me desculpar por ser sincera – a sinceridade é meio escrota de vez em quando, eu sei. Mas, você sabe, a verdade é sempre bem-vinda, embora algumas vezes – como agora – não passe de uma filha da puta. Senta aqui. Eu também já levei um pé na bunda. Eu disse que ele não estava preparado para uma mulher como eu. Você sabe, ele se boicotou. Essa gente tem medo de ser feliz. Depois eu pensei que ele talvez estivesse numa fase confusa ou tivesse problemas pra se relacionar. Talvez ele tivesse câncer terminal e não quisesse me machucar. Ou uma ex-namorada que me mataria se me visse com ele. É claro que ele só queria me proteger. Bem, no fim das contas, ele tinha outra. Era essa a dura e inadmissível realidade. Não havia nenhuma justificativa prévia, nenhuma explicação mirabolante: ele simplesmente não me queria. Era só um pé da bunda. Era só um cara me rejeitando do jeito mais miseravelmente simples do mundo. Então, ela também não se boicotou. Ela não está chateada porque você foi um imbecil indiferente naquela sexta-feira. Ela não está te ignorando só porque você esqueceu de parabenizá-la pessoalmente no aniversário dela. A verdade – que deve ter socado o seu estômago no exato momento em que você a descobriu – é que ela não dá a mínima. E tudo bem. Você deve saber que isso não é exatamente um atestado tácito de que você é um partido ruim – aliás, fodam-se os bons partidos. As pessoas se cruzam, se amam, se detestam ou simplesmente permanecem indiferentes e isso não é um problema nosso. É questão de conexão, do bom e velho desejo mútuo que nem sempre dá as caras. E a gente continua mascarando isso com frases clichê que até poderiam fazer parte de um “Manual de como não ser imbecil ao dispensar alguém”: “A pessoa certa no momento errado”, “Não é você, sou eu!”, “Não quero me envolver com ninguém”… Tudo isso é ladainha – uma ladainha muito elegante, confesso – de quem simplesmente não está a fim de tentar. Não existe momento errado para a pessoa certa. A vontade é que move as coisas – e as pessoas, principalmente. Então, quem não te procura simplesmente não quer te procurar, e quanto mais cedo você parar de criar teorias mirabolantes que justifiquem isso, mais cedo você estará pronto para o próximo pé na bunda – você sabe, ele sempre vem.
E o que eu poderia ser, se não… Sua? Cada parte de mim desejando a sua como se desde o primeiro momento de vida pertencêssemos um ao outro. Sou tua como tu é do mundo… Cada parte do meu corpo grita teu nome… Como anseias tu pela liberdade!
I hate feeling like this… É um começo de dia, um começo de dia sem você, mais um, só mais um, aonde o tempo parece arrastar-se em meio as minhas tarefas matinais, que hoje são feitas no meu modo automático. É como se todos os dias fossem os mesmos; vivo em meu pesadelo pessoal, repetindo o mesmo dia diversas vezes; é o que me perturbar, mais e mais. A cada olhar que lanço para a casa vazia, a cada vento que me beija o rosto fazendo-me arrepiar, ouvindo debulhar-se em minha mente sussurros de suas palavras declarando finalmente estar aliviado por não manter-se preso a mim, não mais, e ainda conseguir fingir que se importa. Mas tudo bem, eu sei que não se importa mais, e não deveria, pois eu vou ficar bem, você sabe que irei superar essa, só mais essa. Talvez seja por isso que mesmo sem querer você age assim, porque sabe que eu sempre supero. Que sou forte o bastante para engolir as lagrimas, enquanto sinto meu coração parar de bater. Mas se eu pudesse, eu lhe sorriria com os olhos cheios de lágrimas, mescladas em felicidade, mágoas, boas lembranças e más, do quanto eu sinto muito. Sim, eu sinto. Sinto por te amar como o amo, sinto por ter deixá-lo me machucar como me machucou, sinto pelas idas e vindas de muitos erros e de muitos acertos, sinto por machucá-lo também, claro que sinto. Sinto pelos ótimos momentos, pelos beijos, pelas caricias, pelas palavras de conforto, pelas palavras de carinho, pelas lágrimas de felicidade, Oh, como sinto, Mas sinto ainda mais por sentir raiva de você, hoje. Consome-me até as entranhas, sufoca-me, enlouquece-me. Tento gritar, mas já não tenho forças pra isso mais, então só respiro e vou vindo com o nó na garganta e com o peito a sangrar, dia após dias. Se você pudesse, se pudesse se sentir como eu, sentir muito como eu sinto. Mas certo, eu irei mesmo ficar bem, mesmo que tenha que tornar-me um robô melhor. Eu vou continuar sentindo, mas dessa vez, sem você.
─ b.m
Não, não, muito cafona, apesar de sempre ter tido certa habilidade para breguices…
Nunca soube direito como se inicia um diário. Menos ainda como se começa com aquele clichê de “querido diário” — soa como se eu escrevesse para alguém, quando na verdade escrevo para mim mesma, sobre ele, é claro. Deixe-me tentar outra vez.
Querida eu, que insiste em complicar o simples…
Deixei de ser a menina dos olhos dele. Ele não disse com palavras, mas sempre tive esse talento questionável de ler silêncios e preencher as entrelinhas — um hábito cultivado que, supostamente, deveria nos proteger de corações partidos. Engraçado, não tem funcionado muito bem, confesso. Eu sei. Talvez ele também saiba. A verdade é que nosso amor se amansou. Virou aquela calmaria confortável, como a brisa fresca das manhãs que se alongam preguiçosas, com o cheiro do café recém-passado e o silêncio doce de quem aprendeu a gostar do tédio da solitude. Nosso amor, querida eu, tornou-se isso há tempos. E eu ainda teimo em chamar de amor, pois é o que sinto. Quanto a ele… talvez reste um carinho morno, uma consideração educada por tudo o que vivemos. Às vezes até, ouso pensar que o que sobra é só conveniência, talvez comodismo. Por que é isso que as pessoas fazem, não é? Voltam ao que conhecem quando a vida se torna vazia demais… ou insuportavelmente cheia. Extremos. Sou o ponto de conforto dele. E nós duas sempre achamos isso bonito, não é? Sei que você está aí, sorrindo de canto, se deliciando com a ironia, achando graça dessa nossa mania de ver poesia na melancolia. Para alguns, ser o lugar seguro de alguém pode parecer desolador, como se você deixasse de ser alguém e se tornasse apenas uma função, mas não para nós. Existe algo genuíno e poderoso em ser o que quer que ele precise. (Querida eu safada, por favor, não malicie essa maldita frase). E assim seguimos…
Pensei em escrever para Chico e Zé, perguntar o que diriam sobre esse amor tão plácido, tão… contido, para que me ajudassem a colocar em ordem essa serenidade de amar o que já não queima, mas, no fundo, sei que só estou escrevendo para mim, o que futuramente entenderei como uma carta de rememoração sobre o sentimento do que foi, o que ficou, o que mudou — e, talvez, exorcizar esse tolo medo do que ainda pode ser, enquanto peço baixinho, feito prece sussurrada para um santo que não sei o nome, que de algum jeito, nós nunca deixemos de ser a menina daqueles lindos olhos — os mais belos olhos que já vi: os dele.
— b.m
"O indivíduo bem equilibrado é insano"
Oh, you fill my head with pieces of a song I can't get out!
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