A única resposta que tinha para aquilo era revirar os olhos. Não era sua preocupação — nem do seu interesse — o que se passava na cama de Camilo, mas obviamente era uma das (poucas) coisas que ele poderia indubitavelmente criticar Camilo. Ao menos a moralidade do homem, ou a falta dela, nunca o deixava na mão. Era incrível sua habilidade de ser... Previsível. Era como se Camilo quisesse que todo mundo o visse apenas como uma imagem caricata de quem realmente era. O personagem mais clichê de uma comédia romântica, mas nesse caso fazendo de tudo para não entrar em num arco de rendenção. A mandibula se contraia involuntariamente — Matteo não se importava. Camilo podia fazer um bacanal que não era da sua conta. Não tinha nenhuma interação com Camilo em que ele enxergasse a possibilidade de acharem um meio termo naquele campo de batalha, que pudessem ao menos ser cordiais. Matteo estaria disposto à deixar de lado ao menos os insultos vazios e as ironias desnecessárias, mas Camilo não parecia interessado numa trégua e ele não estava disposto a tomar todos os tiros para ser alguém melhor.
Novamente, não era completamente imune a alfinetada trocada pelo mauricinho, mas ele não deixaria Camilo saber que aquelas palavras o incomodava. Não precisava de um lembrete de como as informações fugiam da sua mente ou se embaralhavam com outras informações de forma a se tornarem quase incompreensíveis. Não precisava ser lembrado de que ele não havia graduado com honras e que a universidade não estava nos seus planos. Não precisava ser lembrado que era sorte que havia conquistado e chegado aonde havia chegado, e o resto ele colocava nas mãos de gente que conseguia lidar com as informações de maneira estratégica, da forma que ele não conseguia. Ele confiava nos outros para guiar o seu destino. Mas não precisava de Camilo para lembra-lo daquilo de forma alguma. Sua mente indo a mil milhas por segundo e ainda assim ele não conseguindo ter as mesmas conclusões óbvias que os outros era um lembrete constante que ele não estava na mesma frequência que todo mundo. Seus músculos se contrairam com o toque. Instintivamente, ele se arrumava para a batalha, mesmo que aquela fosse apenas metafórica. Não iriam trocar tapas, nem socos, e aquilo era um testamento à sua determinação de não levantar a mão para Camilo. Para parecer menos tenso e deixar a foto mais natural, Teo levou a mão até o meio das escápulos do mais velho, olhando para o fotógrafo numa tentativa de tirar a mente do toque bizarro. Vestígio de uma realidade paralela onde talvez Camilo e Matteo se dessem bem. Com a aproximação súbita, Matteo quase deu um passo para trás instintivamente, sentindo o hálito quente de Camilo em sua pele; e o calor eriçando os pelos na sua nuca desconfortavelmente. Idiotamente, ele culpava a maldição, mesmo que não acreditasse naquilo. O fato de toda aquela fábula envolver os dois de certa forma era a única razão pelo qual ele sequer estava desconfortável naquela proximidade. Ele precisava colocar a distância entre eles novamente. "Por que você está preocupado com meu tamanho, Ricci?" Levantou a sobrancelha, tentando manter o sorriso falso que falhou por um momento. Ele não gostava de ser provocado, muito menos ele gostava de ter que dar satisfação para Camilo. Mas maldito seria se não o respondesse. "Eu ainda posso quebrar você no meio." As palavras duras possuiam grande dissonância com o sorriso que dava para as câmeras, mas tudo fazia parte do teatro e ele já tinha muito treinamento em manter um sorriso para as lentes agora que havia se recomposto o suficiente. "Ou que tal pergunta para Olivia? Ela não tinha nenhum problema com meu tamanho," forçou um sorriso amarelo para o outro. Se tinha algo imperdoável para Camilo, aparentemente, era o fato de Matteo ter namorado Olivia. Pelo que entendia, Olivia nem era ao menos para ser a pessoa que era prometida a Camilo. Era a sua irmã. Era ridículo que ele achasse que podia conquistar Liv com as coisas de família quando ela não seria nada além da segunda escolha.
tudo bem, sabia (beeeem lá no fundo) que não era justo considerar matteo um completo idiota. o próprio camilo não era a pessoa mais academicamente brilhante, embora compensasse com a esperteza safada adquirida durante a vida. acima de tudo, ricci sabia o que era ter pessoas duvidando de suas capacidades e do quão frustrante aquilo podia ser. se ele tomasse um tempo para olhar o mundo além do próprio umbigo, reconheceria que todas as suas provocações não apenas eram maldosas como equivocadas. se matteo fosse assim tão incapaz, como o mais velho estava acostumado a provocar, não teria tanto sucesso. mesmo um rostinho bonito - e um corpo melhor ainda - não seriam suficiente se ele não tivesse nada além para oferecer. mas de todos os momentos em que camilo poderia se disponibilizar a enxergar o outro por lentes mais gentis, aquele com toda certeza não era um deles. especialmente não quando toda aquela conversa de alma gêmea trouxera à tona mais do que nunca o ressentimento por olivia, e todo o sentimento de insuficiência que agora parecia querer instigar em bianchi apenas por despeito. "não se preocupe, isso está na minha lista para mais tarde." instintivamente os olhos buscaram caterina, a jovem loira casada com o presidente do banco da cidade vizinha, um homem pelo menos trinta anos mais velha que ela. então voltou a focar no adversário à frente, particularmente frustrado por sentir que ele era o único a lidar com aquela situação como se fosse uma competição.
ele preferia presumir que matteo simplesmente não era capaz de devolver suas provocações do que acreditar que o mais novo apenas não o considerava merecedor de seu tempo e esforço. talvez se ele engajasse naquela briga que camilo constantemente provocava, eles se socariam uma ou duas vezes e seguiriam em frente. mas não... toda vez que matteo se mantinha suficientemente controlado diante de cada provocação era como um golpe por si só. "é, você não é conhecido por saber muita coisa mesmo." respondeu, o tom repleto de cinismo. antes que pudesse ser ainda mais indelicado, um fotógrafo se aproximou solicitando uma foto. ricci concordou e ajeitou a postura ao lado de bianchi, erguendo o queixo para compensar os míseros dois centímetros que ele jamais admitiria separarem os dois. a mão esquerda se escondeu no bolso da calça e a direita foi até o ombro alheio, em uma espécie de abraço, dando uns tapinhas como se fossem amigos de longa data. não deixou de notar duas coisas: primeiro, o quão enorme eram as costas largas e musculosas do rapaz. ele próprio tinha um físico muito atraente, mas não era tão forte. segundo, o perfume que lhe atingira o olfato provocando uma reação absolutamente diferente do esperado. ele costumava se lembrar do cheiro das pessoas com facilidade, mas não se recordava de que matteo cheirava tão bem. especialmente para um homem das cavernas. talvez fosse a primeira vez que se aproximava dele sem ser após horas de exercício. franziu ligeiramente o cenho para os próprios pensamentos ridículos, um pequeno riso escapando e se camuflando bem como algo intencional para a foto. entre um clique e outro, aproximou o rosto do ouvido alheio, como quem está prestes a contar um segredo. "só te achei meio magrinho. acho que precisa tomar mais whey. ou bomba, sei lá o que você usa"
Deu um sorriso de satisfação ao ouvi-lo dizer que aquele era seu inferno pessoal. Não havia sido a sua intenção, porém Matteo deveria se parabenizar todas as vezes que acidentalmente destruía o humor de Camilo. Não que fosse difícil. Sua mera existência parecia encher o saco do outro. O sentimento era mútuo, mas ao contrário de Camilo, ele não saia do seu caminho para atormentá-lo, como sentia que seu nêmesis fazia. Parte dele achava que Camilo se divertia com aquilo, assim como as crianças que adoravam fazer bullying no passado. Então poderia ser que o que ele dizia ali era apenas para atingi-lo e não se importava com as imagens. Porém, se tivesse a mínima chance de que ele realmente estivesse incomodado, Matteo passaria o resto da noite ao lado de uma das fotos. Encarou o champanhe em sua mão, tentado a virá-lo de uma só vez, mas se bebesse todas às vezes que Milo enchesse seu saco, estaria em Sodoma na depravação, onde Camilo Ricci era o prefeito. Ao contrário do outro, Matteo era muito disciplinado para cair naquela tentação. A sua disciplina era o que havia ajudado-o a chegar aonde havia chegado e conquistar o que tinha. As pessoas como Camilo tinham tudo, desde sempre, então era fácil acreditar que o mundo devia algo a eles. Não podiam ser mais diferentes. "Bem, Camilo, você não precisa ficar aqui. Pode fazer sua generosa contribuição e ir pular a cerca de alguma mulher casada," alfinetou, apesar de não ser nada além da realidade.
Naquele instante, Matteo adoraria ter alguns pontos a menos no QI para sequer perceber que o homem falava com ele. Seria tão mais fácil ignorá-lo. Matteo forçou um sorriso, questionando-se poderia ignorá-lo de alguma forma, mas Camilo sabia muito bem como fazer sua presença ser impossível de desconsider. Se soubesse que Camilo estava envolvido de alguma forma com aquele evento, ele teria mandado enfiar o contrato em um lugar desagradável, mas em nenhuma das suas negociações, o que ele admitia não foram muitas já que a maior parte do que fez havia sido sem nenhuma forma de pagamento, ele desconfiou que Camilo estava envolvido com isso. Afinal, a única coisa pela qual o homem se importava era ele mesmo. 'Vira-lata são os que mais causam comoção'. Era ridículo que as palavras de Camilo pudessem o afetar quando ele detestava o homem. Se tinham uma personificação de tudo que Matteo não gostaria de ser, era Camilo. Libertinagem vestido em ternos que valiam mais que o salário anual da sua mãe, falta de senso comum e uma capacidade de irritar provavelmente até o mais calmo entre os residentes de Khadel. Por que alguém iria querer ser como Camilo? A única coisa que poderia pensar era pelo dinheiro, mas a maioria dos residentes em Khadel eram bem afortunados e aos que não eram, como ele... Existiam certas coisas que o dinheiro não comprava e o seu caráter era uma delas. Mas as palavras dele eram como agulhas perfurando seus ouvidos, um lembrete que ele nunca se encaixou e, não importava o quanto mudasse, não se encaixaria. Apesar de entender e sua mente inquieta está sempre numa velocidade máxima, ele não conseguia pensar em nada para responder. Chegou a abrir a boca para falar algo, mas não tinha uma resposta ácida como seu oponente. Esse não era seu forte. Mas seu forte poderia ser apenas ser melhor que Camilo. Nada iria enfurecê-lo mais se ele não engajasse. "Mudar seu comportamento? Não sabia que você conseguia ter um comportamento diferente de um adolescente com tesão." Distrair, divergir, mudar o assunto como se tivesse desinteressado.
camilo levava pouquíssimas coisas a sério: seu guarda roupa, e o cuidado com os animais. era por isso que adentrava o local ajustando seu terno impecável, pronto para fazer valer as próximas horas naquele evento. uma coisa havia aprendido: havia burocracia demais na benfeitoria. ele tinha dinheiro suficiente para resolver inúmeros problemas; mas sempre haveriam obstáculos no meio do caminho. e por obstáculos, é claro, referia-se à corrupção terrivelmente enraizada em qualquer meio. era um dos motivos, afinal, de apreciar o controle sobre a própria fazenda, visto que tudo ali era de fato em prol dos animais resgatados. infelizmente, camilo não podia comportar todos os animais do mundo no local, e para ajudar os tantos outros fora de seu alcance, não podia se dar ao luxo de uma abordagem simplista e ingenuamente otimista. um grande evento, repleto de pessoas importantes e reconhecido pela mídia, era a melhor maneira de exigir uma prestação de contas por parte dos órgãos envolvidos. ricci sabia que no final, certa parte do valor arrecadado jamais atingiria o objetivo final e nobre — mas assim, pelo menos, podia garantir que a maioria o faria.
a organização não fora de sua exclusiva responsabilidade, embora estivesse envolvido no evento desde o começo. especialmente com as mais recentes descobertas, devia admitir que fora mais relapso do que gostaria nas últimas semanas. prometeu a si mesmo que compensaria ao garantir o sucesso daquele evento. ao parar diante do pôster ridículo em tamanho desconfortável, quase se arrependeu da promessa. com as mãos no bolso, encarou a foto, incomodado. o que aquele idiota tinha a ver com o evento? quem tomou a decisão? “alina” camilo chamou a jovem organizadora, que tirou os olhos de sua prancheta por meio segundo. “o que essa foto está fazendo na parede?” ela pareceu mais confusa que o homem, antes de explicar que matteo era praticamente o garoto propaganda de todo o evento, além é claro do próprio ricci. ainda o relembrou que havia alinhado os detalhes da campanha com camilo há vários dias. ele torceu o nariz ao se recordar que alina o havia ligado justamente no fatídico dia da cascata, em que ele simplesmente não conseguira prestar atenção em nada além do ocorrido. ‘você só disse ‘tanto faz, alina, escolha o que for melhor pra campanha’. bom, o melhor é ele. batemos um ótimo número nas redes sociais e as doações foram significativas.’ camilo revirou os olhos. o melhor é ele. aquele idiota tinha que se enfiar em mais um assunto seu? matteo podia ter ajudado na arrecadação virtual, mas eram os contatos de camilo que faziam as doações substanciais. alina atendeu alguém no celular e saiu andando, bem a tempo de camilo avistar a última pessoa que gostaria de ver.
“isso aqui está dolorosamente parecido com meu inferno pessoal.” disse, apontando para as diversas versões do homem espalhadas pelo recinto. particularmente, a foto com o gato o fazia querer arrancar os olhos fora. “e se for uma amostra grátis do que me espera lá embaixo, talvez seja melhor começar a mudar meu comportamento.” enquanto falava, aceitou uma garrafa de champanhe que lhe fora oferecida. “por mais que eu vá ter pesadelos com essas poses ridículas, admito que você foi uma boa escolha, sabia? vira-latas são os que mais causam comoção mesmo” o sorriso nada combinava com o tom áspero e os dizeres rudes. “ah, desculpa. acho que pra entender sarcasmo é preciso de um QI um pouco mais alto. não se preocupe, na próxima vez que eu te insultar, farei num nível compreensível a uma criança de cinco anos”
Starter fechado para @miloricci
Evento beneficente para os animais na Trattoria Sofia
O evento beneficente para resgate e adoção de animais era uma das coisas que Matteo não se importava de ajudar. Afinal, animais era melhor que a maioria das pessoas. Mas ao ver um pôster seu, sem camisa, segurando alguns dos filhotes disponíveis para adoção, assim que entrou na Trattoria, sentiu seu rosto aquecer e começou a questionar o porque estava ali. Já havia feito a sua parte e poderia ajudar financeiramente sem ter que estar ali presente. Ele já tinha toda a atenção que precisava sem ter que ver um segundo pôster seu, numa posição diferente, e dessa vez com gatos.
Deus, quantos outros pôsters ainda teria ali?
Pegou uma taça de champanhe do garçom que passava segurando uma travessa, mais para ter algo para manter-se ocupado do que pelo desejo de beber, afinal se ele fosse beber toda vez que estivesse desconfortável, acabaria álcoolatra e teria que dizer adeus ao corpo esculpido pelas longas horas de treino e disciplina. Avistou, mais distante um terceiro e, aparentemente, último pôster, mas para sua infelicidade também avistou a última pessoa que gostaria de ver.
Sua última (infeliz) interação com Camilo havia sido naquele dia fatídico na cascata. Para sua felicidade, seus caminhos eram completamente diferentes e não havia interceções nos seu dia a dia. Então, ele não precisava ficar escutando Camilo fazendo piada com tudo que fazia, ou deixava de fazer. Abaixou a cabeça e tentou virar o mais rápido possível para não estar no campo de visão do outro. O que menos precisavam era causar uma cena, ou um assassinato.
( @khdpontos )