Sublimeheresia - Shall I Write It In A Letter?

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3 months ago

Querido, Chico…

Hesitei incontáveis vezes antes de traçar a primeira palavra desta carta. Durante dias, vaguei entre pensamentos desordenados e sentimentos que se recusavam a ser domados pela linguagem. Como explicar algo que nem eu mesma compreendo? Como traduzir uma dor que me escapa toda vez que tento agarrá-la? Tenho medo de que estejamos distantes demais para que qualquer explicação faça diferença e isso me dói mais do que posso admitir. E eu lamento por isso.

Mas, Chico, ontem à noite, sonhei.

Depois de um tempo que já me parecia eterno, sonhei. Tu te lembras das minhas lamúrias constantes, da minha queixa desmedida de que apenas sabia contar os dias quando as noites me ofertavam sonhos? Pois bem, recomecei. Na noite um de 9 de fevereiro, o tempo voltou a fluir. No entanto, não me apresso em te ofertar consolo, pois o que tenho a contar não é notícia inteiramente boa. Te explico.

Eu amava, Chico.

Amava com a devoção impetuosa e incontrolável de uma menina que, desconhecendo os limites do próprio coração, atira-se ao abismo do sentir sem temor algum. Embriaguei-me no êxtase desse amor e, sem pudor ou prudência, vivi. Mergulhei nesse amor sem reservas, sem questionar, sem me proteger. Deixei que esse amor me tomasse por inteira, que me fizesse perder o medo e o juízo. Voei como quem ignora que asas também se partem. Fui feliz, Chico. Intensamente, absolutamente, irracionalmente feliz. E, por Deus, eu sentia! Em cada fibra do meu ser, em cada batida ansiosa do meu peito, eu sentia. O amor me incendiava, consumia-me até o cerne, e eu, tola, acreditei ser amada na mesma medida.

Mas a vida, essa grande ironista, reserva-nos formas brutais de provar que tudo o que acreditamos viver pode não ter passado de um sussurro efêmero no vento. Que anos podem não ser mais que fragmentos de uma ilusão mal urdida. Que todo aprendizado se desfaz ao primeiro toque de um coração ingênuo demais para guardá-lo. E, no fim, Chico, tudo se reduziu a isto: um amor juvenil, um devaneio imaturo, um delírio insustentável.

E eu, louca, acreditei.

Deixei um convite sobre a mesa dele. Escrito com calma, com letras desenhadas como se cada traço pudesse garantir o destino que eu tanto queria: “Encontre-me às duas, em frente à Duomo de Florença. Vista seu melhor terno.”

Já consegues antever o desfecho trágico, não é? Mas eu, cega na minha esperança infantil, não. Eu esperançava, Chico! E esperançava tanto que me vesti para um sonho. Escolhi meu vestido mais belo, ajeitei os cabelos com esmero, colori os lábios com a cor dele e pisei em saltos finos como se estivesse à altura da ocasião — a ocasião do meu próprio casamento.

Não me alongarei nos detalhes, pois já não sei se valeriam a pena. Mas ele veio, Chico. Ele veio. E estava belo, como eu ousara imaginar. Quisera eu poder dizer que vislumbrei a imagem de um anjo quando o vi subir os degraus da catedral. Mas não. Associar tamanha beleza a algo celestial seria heresia.

Eu sonhei, Chico.

E cada degrau que ele subia era como uma lâmina a me atravessar o peito. O tempo se dissolvia, e a dor que ali nascia parecia anterior à minha própria existência, como se eu tivesse vindo ao mundo para senti-la. Como se fosse uma sina. Como se Deus, do alto de Seu trono, observasse minha desgraça com deleite silencioso, sem intenção alguma de intervir.

Foi belo, Chico.

Tão belo que chorei.

E então acordei.

Acordei no exato instante em que a porta dos fundos se fechava, selando o destino do que nunca fora verdadeiramente nosso. Um fim tão absoluto quanto o silêncio após um último suspiro. O fim de um amor juvenil, de um verão desfeito em outono. E o que restou de tudo isso? Apenas uma carta, largada sobre a mesa ao lado da minha cama.

O papel, Chico, trazia uma caligrafia diferente da minha. Apressada, desprovida de zelo ou de qualquer vestígio de afeto. Não havia hesitação nem doçura, apenas um veredito cruel e inapelável:

“Sinto lhe decepcionar, mas não podemos nos casar! Meu coração pensou que te pertencesse, mas ele se enganou! Até nunca mais!”

E assim, Chico, acabou-se.

Com amor, sua Heresia.

— b.m


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2 months ago

“Não disse que não é amor, definitivamente é, mas eu sei que é efêmero e que o tempo há de mudá-lo como o inverno muda as árvores, e mesmo que eu te amasse com todas as forças do meu corpo nem em cem anos poderia te amar tanto quanto te amei em um único dia. Talvez daqui 100 anos eu ame ainda mais, tanto, que tu já tenha se espalhado de tal forma, sendo impossível de tirar daqui do meu eu mais secreto e íntimo não como um prazer, porque eu não sou um para mim mesma, mas como o meu próprio ser existindo na sombra da tua existência, sendo apenas a metade e não meu todo. Onde não há você, não existe eu, só vazio.”

1 year ago

“Dor que é dor a gente guarda por mais que doa por mais que arda Dor que é dor Carrega consigo um parceiro antigo o silêncio esmagador que traduz a dor em dor.”

— Ana Favorin, A dor a gente não grita.

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Shall I write it in a letter?

Oh, you fill my head with pieces of a song I can't get out!

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